Pediatria Humanizada

Pediatra da Maternidade Santa Fé
13/10/2014
Autor: 
Dra. Soraia Nogueira dos Santos

     

 A humanização na assistência ao parto pressupõe uma equipe profissional interdisciplinar entrosada e engajada com os mesmos valores (respeito à gestante, obedecendo às suas preferências e escolhas, e respeito à fisiologia do parto), evitando-se as imposições e intervenções desnecessárias,  além de um ambiente tranqüilo e adequado.

       O nascimento representa para o ser humano talvez o momento de maior mudança em toda sua vida. No nascimento, o bebê deixa o útero materno, onde esteve aconchegado durante toda a gestação e tinha todas as suas necessidades supridas. Chega a um ambiente desconhecido, muitas vezes frio e barulhento. Tem que contar agora com o funcionamento imediato de todos os seus órgãos para que possa sobreviver. É realmente um trauma e um grande desafio!

       Para os pais, também, o nascimento de um filho é um momento muito especial e cheio de expectativas. É chegada a hora de ver de perto aquele “serzinho”, cujo crescimento eles acompanharam por 9 meses, cujos primeiros movimentos sentiram  e de quem ouviram as primeiras batidas do coração.

       Hoje, existem dados seguros sugerindo que a forma como nascemos tem conseqüências para o resto de nossas vidas. Também já há comprovações científicas apontando que a forma como a mulher deu à luz pode influenciar a qualidade e duração da amamentação.

      Como pediatra, o que poderia fazer para atender a esse novo ser que está chegando , da melhor forma possível? Acredito que seria o acolhendo de uma maneira calorosa e, ao mesmo tempo, sendo o menos intervencionista possível,  respeitando os sinais que ele nos dá e o entregando a quem o conhece melhor do que todos nós, ou seja, à sua mãe, imediatamente após o parto.

     O primeiro contato do pediatra com a gestante, no pré-parto ou mesmo numa consulta antes do parto, é muito importante e dá oportunidade para que se esclareçam as dúvidas e para que a mãe se tranqüilize com os cuidados que serão dados ao bebê.

    Também devemos assegurar um ambiente com menos luz e menos ruído durante todo o trabalho de parto e o parto. O excesso de luz e a linguagem racional estimula a neo córtex e inibe a liberação de ocitocina, importante hormônio responsável pelas contrações uterinas e pela liberação do leite materno. Um ambiente excessivamente turbulento e confuso aumenta a ansiedade materna e a agitação do bebê, dificultando a interação mãe-bebê, reconhecidamente tão importante.

     Alguns procedimentos de rotina podem ser repensados quanto à forma e ao momento em que são realizados, tais como:

A aspiração das vias aéreas: se o bebê nasce bem e consegue se livrar sozinho das secreções da boca e narinas, não precisamos aspirá-lo.

A ligadura do cordão umbilical não precisa ser realizada imediatamente após o nascimento; podemos esperar alguns segundos ou até que pare de bater; é claro que respeitando as indicações médicas que indiquem o contrário.  

    Tão logo quanto seja possível, o bebê deverá ser colocado em contato direto, pele a pele, com sua mãe.  A pele é o órgão sensorial primário do recém-nascido e o contato corporal mãe-bebê possibilita bem estar, segurança e afetividade, aumentando o vínculo materno com seu filho.

    O aleitamento na primeira hora de vida também é outro objetivo nessa assistência humanizada. Depois de alguns minutos do contato pele a pele o bebê começa a apresentar sinais de procura do seio materno. É importante respeitarmos essa interação mãe-bebê  e deixar que a mãe reconheça esses sinais que o bebê lhe dá.

     Não podemos nos esquecer da presença do pai, que acompanhou todo o processo da gestação e participou do trabalho de parto, apoiando a mãe, tanto emocionalmente quanto, muitas vezes, até fisicamente. Ele também é muito importante nessa acolhida ao bebê. Se não for possível a presença do pai, uma outra acompanhante da escolha da mãe lhe dará apoio e segurança tão necessárias nesse momento.

    O ideal é que o bebê  permaneça no colo da mãe durante toda primeira hora de vida, fase na qual encontra-se um estado comportamental chamado de inatividade alerta, quando o bebê é capaz de fixar o olhar nos olhos da mãe, sentir o cheiro do leite materno, ouvir a já conhecida voz materna.

    Dessa forma, tomando como referência o conceito de Humanização do Ministério da Saúde dentro da Política Nacional de Humanização:  “oferta de atendimento de qualidade, articulando avanços tecnológicos com acolhimento, melhoria dos ambientes de cuidado e das condições de trabalho dos profissionais” (Ministério da Saúde,2004), tentamos oferecer ao núcleo pai/mãe/bebê, um atendimento que leve em consideração os seus anseios e expectativas, e que considera o momento do parto como especialmente decisivo para o resto de suas vidas.

(Este artigo foi publicado originalmente no Jornal Bem Nascer/da ONG Bem Nascer)

(Na foto, Denise e o pai no parto da Catarina-assistido por Dr. Marco Aurélio Valadares)

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